A sanção pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva, em julho deste ano, da Lei 15.177/2025 (23/7/2025), que estabelece cotas de 30% para mulheres nos conselhos de administração de estatais, é um marco legal, político e social no Brasil. Um marco para a governança corporativa das sociedades brasileiras. A grande questão que se apresenta agora não é mais por que fazer, mas como fazer dar certo.
A nova lei, cujo texto não é extenso, exige o cumprimento progressivo de um sistema de cotas: 10% na primeira eleição para o conselho, 20% na segunda e 30% na terceira. A lei também reserva 30% desse total para mulheres negras ou com deficiência. Os conselhos de administração que descumprirem essas regras ficam impedidos de deliberar qualquer matéria até regularizarem sua composição. Nas empresas privadas de capital aberto, a adesão à cotas de 30% é facultativa.
Em 2019, este Espaço Governança produziu três artigos complementares entre si sobre o assunto, vistos ao final do presente texto e apontando, principalmente: a baixa representatividade feminina nos conselhos, o tempo que poderia levar para uma representação igualitária (então visto como desanimador), a possibilidade de cotas e seus possíveis prós e contras.
O novo marco legal mudou as discussões, o jogo do poder é outro nas estatais. Trata-se de uma política de Estado, afirmativa, proposta pelo Poder Legislativo (deputada Tábata Amaral, PSB) e sancionada pelo Poder Executivo. Agora, o foco é a efetividade, para que a Lei seja bem sucedida.
A efetividade da Lei 15.177/2025, isto é sua aplicação com eficiência, eficácia e brilho, passa por alguns requisitos.
Em âmbito organizacional
1. Comprometimento institucional autêntico, com o engajamento direto da alta liderança das estatais e de seus órgãos de governança, para que o texto legal não seja visto como mera obrigação formal, mas como oportunidade estratégica em prol de efetiva diversidade;
2. Mudança cultural profunda e contínua, com ações internas de conscientização, combate a vieses inconscientes e valorização da diversidade como vetor de performance, não de fragilidade;
3. Mapeamento, capacitação e mentoria estruturada de mulheres com potencial para atuar em conselhos, assegurando acesso equilibrado a funções colegiadas, interna e externamente;
4. Revisão dos critérios de nomeação para conselhos, incorporando competências específicas de ética, governança e sustentabilidade, com transparência e sem indicações políticas (usando-se aqui tal palavra no sentido de politiqueiras);
5. Integração da política de diversidade à estratégia da empresa, interconectando a presença feminina no conselho e nas demais estruturas da organização; e,
6. De forma mais ampla, considerando todo o colegiado que é o conselho de administração, adoção de indicadores de performance, tanto quantitativos quanto qualitativos. Estamos tratando aqui da avaliação dos conselhos, de forma completa, pois eles são, com dito, colegiados.
No ambiente mais amplo
1. Fortalecimento da atuação dos órgãos de controle, como TCU e CGU, com foco na fiscalização da aplicação da lei e na publicação de relatórios periódicos sobre o seu cumprimento;
2. Articulação do Estado com instituições de ensino e entidades de governança, para a formação técnica continuada de conselheiros e conselheiras, bem como a geração e disseminação de conhecimento. Jovens estudantes nas universidades necessitam saber que este espaço de trabalho se abre no seu futuro;
3. Comunicação institucional proativa e engajadora por parte do Estado, que mostre à sociedade – com dados, histórias e resultados – que a representatividade nos conselhos é parte de um modelo de Estado mais democrático, eficiente e legítimo; e,
4. Criação e manutenção de bancos de talentos femininos, acessíveis às empresas, com atenção à inclusão de mulheres negras, com deficiência e também indígenas, em busca de pluralidade e competência.
Ao aprovar a Lei 15.177/2025, o Brasil deu um passo civilizatório em prol da diversidade que, bem conduzida e com verdadeira intenção de favorecer a organização, realmente a favorece. Sim, pois a diversidade também pode ser fake e apenas para constar, como discorremos em artigo publicado sobre essa questão neste EG, visto abaixo.
A grandeza da medida, a nosso ver, muito bem intencionada, merece que a implementação seja também consistente com o mérito da sua criação e aprovação. Agora, temos a Lei e precisamos dela fazer uma alavanca de transformação na sociedade, do mundo corporativo e de governança corporativa.
Mônica Mansur Brandão
Revisto em 11/8/2025, para segregar os requisitos da efetividade nos dois grupos acima e reforçar a característica colegiada dos conselhos de administração.
Leituras sugeridas:
Importante:
O PL 7179/2017, citado no artigo Participação de mulheres nos conselhos de administração: como acelerar 1/2 (link acima) não teve desdobramentos legais. Já o PL 1246/2021, da deputada Tábata Amaral, resultou na Lei 15.177/2025, sancionada pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva, em julho de 2025. Registre-se que há cerca de oito anos se busca mais representatividade feminina nos conselhos de estatais.