domingo, 14 de junho de 2020

Fake news na pauta da Suprema Corte


Para Fachin, inquérito das fake news continua, com restrições.

Quarta-feira, 10 de junho, marcou o início do julgamento da legalidade do inquérito das fake news no Supremo Tribunal Federal (STF). Se considerado ilegal, o inquérito será anulado, e se for julgado legal, prosseguirá, podendo colocar em risco jurídico não apenas políticos e empresários, mas o próprio Poder Executivo, com desdobramentos no TSE, se esse inquérito sobreviver à luta das forças políticas em jogo.

Por enquanto, apenas o ministro Edson Fachin votou – e seu voto expressa um jogo de movimentos paradoxais: ao mesmo tempo em que considera o inquérito legal, o ministro impõe regras que restringem seu alcance. O julgamento do inquérito das fake news será retomado na quarta-feira, 17 de junho, quando os outros 10 ministros do STF começarão a declarar seus votos.

O inquérito das fake news foi iniciado pelo presidente da Suprema Corte, Dias Toffoli, para investigar ataques caluniosos ao STF. Permitiu que outro ministro, Alexandre de Moraes, iniciasse, em 2019, um contra-ataque, retirando do ar uma reportagem que atacava Toffoli no site da revista Crusoé.

O inquérito em questão permitiu ainda que Moraes deflagrasse, em maio deste ano, uma operação contra parlamentares, empresários e ativistas aliados do presidente Jair Messias Bolsonaro, suspeitos de integrar uma sociedade que operaria uma rede de disseminação de notícias falsas e ameaças ao STF, inclusive com a defesa do fechamento da Corte pelas Forças Armadas.

Em sua operação de maio, Alexandre de Moraes determinou, dentro do inquérito das fake news, que fossem quebrados os sigilos bancário e fiscal de quatro empresários que apoiam o presidente Jair Messias Bolsonaro, para apurar se eles teriam financiado uma rede de disparo de notícias falsas e ataques contra ministros do STF. A decisão determinou a quebra de sigilo desde julho de 2018, o que pode revelar eventuais ações desses empresários durante a campanha eleitoral daquele ano.

Se a iniciativa de Moraes em 2019 foi criticada como censura dentro da própria Corte, as ações de 2020 não foram criticadas com discursos. Ao mesmo tempo, a decisão de Fachin corre o risco de prejudicar o próprio STF, quando se consideram as quatro regras impostas pelo ministro à investigação. Será necessária grande atenção dos ministros para que o risco seja mitigado.

A primeira regra é que o inquérito deve ser acompanhado pelo Ministério Público. Em segundo lugar, as defesas dos investigados devem ter amplo acesso às provas produzidas na investigação. Além disso, o inquérito só pode investigar o que seja “risco efetivo à independência do Poder Judiciário” e, assim, atente “contra o Estado de Direito e contra a democracia”. Por fim, o inquérito deve preservar o direito de liberdade de expressão e de imprensa, excluindo matérias jornalísticas, postagens, compartilhamentos e outras manifestações, inclusive pessoais, na internet, feitas anonimamente ou não, desde que não integrantes de esquemas de financiamento e divulgação em massa nas redes sociais.

A decisão de Fachin sobre permitir o acompanhamento da investigação pelo Ministério Público acata uma declaração anterior do Procurador Geral da República, Augusto Aras, a qual é consoante com o desejo do Advogado Geral da União, José Levi. Com respeito à quarta regra, o ponto de atenção é se esta não poderia cercear a consideração de matérias e postagens no âmbito do processo. Os atingidos pela operação de maio usaram exatamente o direito à livre expressão como argumento de defesa.

Se considerado legal pela maioria dos ministros da Suprema Corte e prosseguir, o inquérito das fake news poderá alimentar com provas outras investigações, em andamento no Tribunal Superior Eleitoral (TSE). Quatro Ações de Investigação Judicial Eleitoral, abertas no TSE, pedem a cassação da chapa Bolsonaro-Mourão. Essas ações apontam a possibilidade de a campanha da chapa ganhadora das eleições presidenciais de 2018 ter contratado serviço ilegal de disparos em massa de mensagens pelo aplicativo WhatsApp, a fim de atacar adversários, via disseminação de fake news.

Ainda no campo de batalha jurídico, a chapa do Partido dos Trabalhadores (PT), derrotada nas eleições de 2018, pediu o compartilhamento de informações entre o inquérito das fake news e as ações do TSE. A defesa da chapa vencedora reagiu e o Ministério Público Eleitoral se posicionou contra esse compartilhamento, alegando que os trabalhos ainda estão em estágio inicial e sinalizando que, posteriormente, pode autorizar a união das provas encontradas nas investigações.