sexta-feira, 11 de agosto de 2017

Caso Mary Kay Cosmetics: por que entrar e sair da Bolsa de Valores?



Mary Kay Ash (1918-2001), nascida no Texas, EUA, e autora do livro Milagres Acontecem (1994), foi uma mulher ímpar, quando se considera a mentalidade dos anos sessenta, período em que ela buscou a realização de seu sonho, após trabalhar durante 25 anos com vendas: criar uma empresa que operasse de acordo com as suas convicções pessoais. A empresa Mary Kay Cosmetics nasceu de economias familiares, do dinheiro que Mary acumulara para desfrutar sua aposentadoria; se ela fracassasse, teria que trabalhar até o final de sua vida para sobreviver.

 O início não foi fácil; Mary perdeu o marido subitamente, pouco antes de a empresa entrar em operação, e teve que tomar uma decisão crucial: seguir ou não adiante. Desaconselhada a prosseguir, mas com o apoio dos filhos, muito jovens, a empresária foi adiante, perseguindo a chance única que teria de realizar seu sonho. Assim, em 13 de setembro de 1963, Mary inaugurou seu negócio, contando com os filhos e nove colaboradoras por ela inicialmente preparadas.

Após anos de discriminação profissional, apesar de ótimos resultados alcançados, Mary Kay Ashley almejava implantar um modelo de empresa e de negócio que respeitasse as mulheres, combinando empreendedorismo, meritocracia, flexibilidade de tempo para criar a família (importante para as mulheres), qualidade de produtos, marketing não agressivo (produtos deveriam ser bons o suficiente para se venderem per se) e apoio.

Cada consultora da empresa seria, portanto, uma microempresária, abastecida com produtos de qualidade, treinamento e suporte. Assim, a Mary Kay Cosmetics fez opção inicial pelo empreendedorismo feminino, com gestão financeira de baixo risco, baseada na crença capitalista norte-americana cash-and-carry, ou seja, pagar e levar. A ausência de dívidas das consultoras com a empresa pelo pagamento à vista de produtos mitigaria o risco financeiro, permitindo maiores bônus.

Muito poderia ser dito sobre Mary Kay Ash e sua empresa, a Mary Kay Cosmetics, criada a partir de um sonho, mas este artigo focaliza dois eventos particularmente importantes da história dessa organização: (1) a abertura de seu capital em 1968 e sua listagem na Bolsa de Valores; e, (2) o fechamento do capital e a retirada das ações da Bolsa, decidido em 1985.

A decisão de abrir o capital e listar ações em Bolsa de Valores foi tomada visando implementar as melhores práticas administrativas vigentes mas, com o passar do tempo, percebeu-se que o mercado constituía-se não em uma alavanca, mas em um obstáculo ao crescimento. No livro supracitado, a empresária enfatiza o foco de curto prazo do mercado acionário norte-americano e a ênfase dos profissionais desse mercado em resultados e projeções de lucros de curto prazo. Para Mary Kay, era surpreendente que meras flutuações negativas de curto prazo fossem tratadas como perdas por especialistas financeiros.

A segunda crítica de Mary diz respeito aos gastos de uma companhia com ações em bolsa e de informar acionistas, profissionais de investimento e o governo entre outros públicos. Esses dispêndios, ao invés de ajudarem a empresa, criavam, segundo a empresária, uma influência exógena baseada em uma visão de curto prazo não consistente com a estratégia empresarial de longo prazo. Tendo retirado sua empresa da Bolsa de Valores, Mary Kay destaca que não foram alteradas as práticas empresariais com relação às consultoras e diretoras; tampouco foi alterado o foco no empreendedorismo feminino.

Os mercados de capitais ajudam, de maneira geral, empresas a financiarem projetos de longo prazo com menores custos de captação. Esta é a lógica. Terá o mercado de capitais dos EUA falhado em oferecer alternativas para favorecer o crescimento da Mary Kay Cosmetics ou terá essa, um exemplo de sucesso, mesmo assim, perdido a oportunidade de aproveitar oportunidades que não conseguiu visualizar?