sexta-feira, 25 de agosto de 2017

Existem paradigmas no governo das organizações?


O que é um paradigma? 

Em 1962, Thomas Samuel Kuhn, doutor em física pela Harvard University, publicou o livro A estrutura das revoluções científicas, que teve grande repercussão junto à comunidade acadêmica – e ainda tem. Na obra, Kuhn apresenta o conceito de paradigma: trata-se de uma teoria forte, aceita por uma comunidade de praticantes de uma dada ciência, que sustentará o desenvolvimento de teorias, modelos e leis que gravitarão ao redor dos seus fundamentos, até que anomalias descobertas conduzam à formulação e consenso em torno de uma nova teoria forte

Como exemplos de paradigmas, podem ser citados estudos como Física, de Aristóteles, Almagesto, de Ptolomeu, Principia e Óptica, de Newton, Eletricidade, de Franklin, Química, de Lavoisier e Geologia, de Lyell, os quais, segundo a visão de Kuhn, se prestaram, durante certo tempo, à definição de problemas e métodos de pesquisas para gerações posteriores de praticantes da ciência.

A leitura da obra de Kuhn permite identificar no mínimo sete características de um paradigma, segundo sua definição do termo: 1. universalidade (o paradigma repousa sobre realizações científicas universalmente aceitas); 2. temporalidade (não é eterno); 3. ineditismo (é inédito); 4. abertura (é aberto o suficiente para permitir pesquisas nele baseadas); 5. compartilhamento (passa a existir quando compartilhado por pessoas com regras comuns de prática científica); 6. validade (intrinsecamente, é tão bom que as escolas antigas gradualmente deixam de existir); 7. ancorabilidade (ancora ou serve como referência para o desenvolvimento de teorias e modelos sem a necessidade de explicações sobre conceitos básicos).

Segundo Kuhn, o desenvolvimento científico se desenvolve por etapas. A primeira é a emergência de um paradigma e sua aceitação por uma comunidade de cientistas. Em seguida, vem o desenvolvimento de estudos e pesquisas baseados no paradigma citado, considerado válido. Na sequência, identificam-se pontos falhos no paradigma e contestações. Por fim, emerge um novo paradigma, configurando uma revolução científica. E a partir desse ponto, o ciclo se repete. 

O livro de Kuhn gerou tanta polêmica, em função de seus pressupostos, que o próprio autor, antes de falecer em 1996, produziu novos trabalhos tentando melhor clarificar suas ideias. Conforme dito, ele era físico por formação e seu livro foi desenvolvido com base nas disciplinas que estudam os fenômenos físicos.  Boa parte da polêmica veio dos especialistas em ciências humanas, mas não toda a polêmica.

Ainda que mantendo um viés Thomas Kuhn: consideraremos paradigma neste artigo como sendo um modelo a ser perseguido, em função de características admiradas por um grupo de pessoas, que pode, inclusive, corresponder a uma comunidade profissional. Posto isso, perguntamos: existem paradigmas de governo das empresas? Dito de outra forma: existem modelos de governança a serem perseguidos pelas empresas? Como os investidores do mercado de capitais percebem essas questões?

As discussões sobre governança corporativa se concentram entre dois modelos conceituais: o modelo financeiro, segundo o qual as empresas existem para atender, em primeiro lugar, aos sócios, e o modelo dos públicos estratégicos ou stakeholders, o qual preconiza que as empresas existem para gerar riqueza para um grupo de públicos que delas dependem, como sócios, empregados, clientes, fornecedores e outros.  

Entretanto, quando aprofundamos a realidade de uma organização, percebemos que ela tem especificidades operacionais que tornam, no mínimo, temerário adotar essa ou aquela corrente ideológica. Por mais focados em resultados econômicos que estejam – e necessitam estar – os dirigentes de uma sociedade por ações, dificilmente eles poderão ignorar, ao menos por longo tempo, as demandas sociais e ambientais que se intensificam sobre suas empresas. 

Adicionalmente, os investidores dos mercados de capitais prestam, sim, atenção a essas demandas. Assim sendo, talvez a melhor resposta para a pergunta do título deste artigo seja: não existem modelos paradigmáticos de governança corporativa, existindo, porém, as melhores políticas e práticas de governança vislumbradas em um dado momento, bem como as escolhas do mundo real, aquelas que os dirigentes organizacionais definem como sendo aquelas possíveis.

Mônica Mansur Brandão