sexta-feira, 17 de agosto de 2018

Caso Semco: da empresa familiar tradicional à empresa de participações


Ricardo Frank Semler nasceu em São Paulo, em 1959, é empresário e presidente do conselho de administração e sócio controlador da Semco Partners. Graduou-se em Direito pela Uinversidade de São Paulo (USP) e fez treinamento em Administração pela Harvard University. É autor dos livros Virando a própria mesa (1988) e Você está louco! (2006). Entre empresários brasileiros que escreverem livros, Ricardo Semler é o mais lido no exterior. Virando a própria mesa, em especial, foi um grande sucesso no Brasil e em muitos países.

A Semco Partners é a empresa de participações que ocupou o lugar do grupo Semco, ao longo da trajetória dos negócios iniciados pelo engenheiro Antônio Kurt Semler, pai de Ricardo. No livro Você está louco!, Ricardo Semler descreve passagens importantes do histórico do grupo que resultou na Semco Partners, muito interessantes como objeto de estudo de empresas familiares.

Aos vinte e dois anos, diante da resistência paterna a que ele assumisse a direção dos negócios da família, Ricardo decidiu ter uma experiência empreendedora própria, sem praticamente gastar dinheiro com isso, assumindo uma firma necessitada de recuperação financeira. Preocupado com a iniciativa do filho, Antônio Semler terminou por concordar com o comando da Semco pelo jovem Semler, mesmo com dúvidas quanto às potencialidades do filho empreendedor.

Você está louco relata mais. Em um Brasil dos anos oitenta, em que diversas empresas dependiam de fazer negócios com o Estado brasileiro para sobreviverem, antes de uma abertura que viria a destruir empreendimentos (porém, fortalecendo outros, mais proativos), Semler e seus executivos perceberam o risco dessa estratégia de dependência e foram a campo, dentro e fora do Brasil, buscar novos negócios.

A administração Semler mutiplicou o patrimônio familiar via boas aquisições de negócios e um modelo de gestão com processos mais flexíveis e maior envolvimento dos empregados e de seus representantes sindicais. Experimentador organizacional, o empresário alterou práticas de gestão, estabelecendo relações sindicais menos conflituosas, em um ambiente em que os sindicalistas eram, por vezes, tratados de forma agressiva por empregadores, com auxílio do aparato do Estado.

O caso Semco apresenta um mix interessante de empreendedorismo (o crescimento foi buscado por meio de aquisições e outras iniciativas), estratégia (a dependência do Estado foi eliminada e novos negócios foram criados) e profissionalismo (o modelo de gestão se tornou mais profissional, com uma estratégia atenta ao ambiente externo, processos mais flexíveis e pessoas mais ouvidas).

O triângulo de virtudes acima citado – aliás, também aplicável a empresas não familiares –, foi fundamental para que a organização, de origem familiar com administração em moldes clássicos dos anos oitenta, evoluísse até o status de uma empresa de participações, com negócios no Brasil e em outros países e uma lógica distinta da empresa familiar original.

Você está louco narra, ainda, uma passagem peculiar, na qual o autor descreve seu período de vice-presidente na Federação das Indústrias de São Paulo (FIESP), desde o seu ingresso na “ala infantil” da Entidade (expressão cunhada por Semler para se referir a si mesmo e a outros empresários de sua faixa etária, já que a “ala jovem” da Federação teria, então, mais de cinqüenta anos). Semler narra que ele chegou a ser caracterizado como “vermelho” por alguns opositores.

A leitura de Você está louco e Virando a própria mesa são importantes para quem deseja mais detalhes sobre o caso Semco. Ao seu estilo, Ricardo Semler direcionou os negócios familiares para um formato bem distinto daquele provavelmente imaginado por seu pai, Antônio Semler. Se Ricardo Semler escrevesse um terceiro livro, fechando a trilogia, este seria – com certeza – uma contribuição muito importante ao estudo de empresas familiares brasileiras.