quarta-feira, 26 de novembro de 2025

Ética como redenção: Filme Perfume de Mulher


Al Pacino é um dos maiores atores de cinema de todos os tempos, como já dissemos no artigo Ética como escolha: Filme O Advogado do Diabo. Pacino também está presente em um filme que é, a nosso ver, uma bela peça sobre a ética – mas dessa vez, como redenção do indivíduo.

Frank Slade (Al Pacino), tenente-coronel reformado e cego, em função de um acidente nas forças armadas, vive isolado e amargurado. Cansado da vida, planeja um último fim de semana de prazer antes de terminar sua própria existência. Para acompanhá-lo, contrata Charlie Simms (Chris O’Donnell), um estudante pobre de uma escola de elite, bolsista, que batalha por um futuro melhor.

Charlie, por sua vez, enfrenta um dilema ético: viu colegas ricos armarem uma brincadeira cruel contra o diretor da escola, mas se recusa a delatá-los, mesmo sob forte pressão e ameaça de expulsão.

Durante a viagem, o militar reformado Slade viaja com Simms até New York, visita seu irmão e família (triste visita, aliás), vivencia alguns excessos, dirige uma Ferrari durante alguns minutos, com Charlie a seu lado (suborna um vendedor para isso). E dança o inesquecível tango com a bela personagem Donna (Gabrielle Anwar), em uma cena que se tornou um clássico do cinema.

Slade tenta ensinar Simms sobre os prazeres da vida. Mas é Charlie Simms quem o ensina o que Frank Slade havia esquecido, em meio ao seu sofrimento, na escuridão da cegueira em que se sente preso: existe decência.

Diante do conselho escolar e de uma plateia de jovens estudantes, Frank Slade faz um discurso monumental em defesa do jovem Simms, denunciando a hipocrisia dos adultos daquela escola de elite, berço de luminares dos Estados Unidos, exaltando a coragem moral. A cena é outro clássico do cinema norte-americando – e mundial.

O homem salvo pelo reflexo da virtude

O tenente-coronel Frank Slade não começa o filme como um herói moral. Na realidade, trata-se de um ser humano que se sente em ruína. Mas ao conviver com Charlie, percebe no jovem íntegro e batalhador a ética da qual ele não mais se lembrava. A pureza moral do outro o confronta – e o desperta.

A ética, para Slade, não parece ser um código, mas a nobreza humana que prova: a vida ainda vale a pena de ser vivida. Ele não se converte à moralidade tradicional, mas reencontra sua humanidade ao reconhecer e defender o que entende ser moralmente certo.

Ao defender Charlie Simms, Frank Slade assume o papel do líder ético: não o que manda, mas o que protege; não o que busca aplauso, mas o que se arrisca pelo que entende ser justo.

In loco parentis – declara o ex-militar perante o colegiado e a plateia de estudantes: os pais de Simms residem em outro Estado, mas Slade se apresenta como seu representante, em defesa de Charlie – e do que ele percebe ser moralmente certo.

Enquanto John Milton, em O Advogado do Diabo, destrói pelo encanto, Frank Slade reconstrói pelo exemplo. Ele se salva porque, ao proteger a virtude de outro, redescobre a própria. A ética, nesse caso, é o remédio para a cura da desesperança.

Uma postura ética pode devolver sentido à vida

Ao defender o jovem Charlie Simms, Frank Slade volta a acreditar na vida. Charlie lhe devolve a fé na dignidade humana. E a mudança pode ter sido mais abrangente, criando uma vida afetiva mais feliz – e enriquecida pela percepção aguçada de Slade em relação a perfumes de pessoas do sexo feminino. 

A salvação de Slade não é religiosa, mas existencial. Ele é redimido pela ética refletida, pela coragem do outro que reacende sua luz, que o faz se reconectar com o amor que tem pela vida. A ética não o torna perfeito, torna-o novamente humano. 

Esta é apenas uma leitura do filme Perfume de Mulher. Existirão outras, certamente, mas esta é a nossa preferencial.


Mônica Mansur Brandão


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