quinta-feira, 3 de julho de 2025

A rejeição da reforma do Novo Mercado da B3


A rejeição oficializada à proposta de atualização do regulamento do Novo Mercado da bolsa de valores brasileira (B3) representa uma estagnação que mais se assemelha a um passo atrás no processo de amadurecimento desse relevante segmento de governança corporativa.

Criado no ano 2000, o Novo Mercado surgiu como um selo de excelência em governança, com adesão voluntária das companhias listadas em bolsa ao compromisso com padrões mais elevados do que aqueles exigidos pela legislação vigente.

Desde sua origem, o Novo Mercado tem sido um referencial importante para investidores que buscam segurança, transparência e responsabilidade no ambiente corporativo brasileiro. A revisão proposta visava a fortalecer esse selo, atualizando-o conforme padrões internacionais e alinhando suas exigências a melhores práticas globais.

Após um processo amplo de escuta, incluindo consulta pública, 25 propostas de alteração foram submetidas à votação. Entre elas estavam:

- Aumento do percentual mínimo de conselheiros independentes, reforçando a autonomia e a diversidade dos conselhos de administração;

- Limitação ao acúmulo de cargos por conselheiros (overboarding), visando aprimorar o desempenho das funções de governança;

- Outras medidas alinhadas a códigos internacionais de boas práticas, recomendações de investidores institucionais e padrões já praticados por diversas empresas – inclusive algumas que votaram contra as mudanças.

Infelizmente, cada proposta foi rejeitada por mais de um terço das empresas votantes, inviabilizando avanços no regulamento. Esse resultado, embora legítimo do ponto de vista processual, é preocupante, como bem pontuou o Instituto Brasileiro de Governança Corporativa (IBGC), em manifestação sobre o assunto. Entre outras considerações do Instituto, aqui destacamos:

- Muitas empresas que rejeitaram as mudanças já praticam internamente os padrões propostos. Então, indagamos: se tais práticas já são válidas internamente, por que barrar sua formalização institucional?

- A rejeição integral compromete a força simbólica do Novo Mercado como selo de confiança. Para o investidor estrangeiro especificamente, o episódio reforça a imagem de um país cuja governança ainda enfrenta resistências estruturais e patrimonialistas.

O cenário impõe aos investidores do mercado de capitais, aos seus agentes e especialmente à B3 o desafio de buscar novas estratégias para incentivar a excelência. Apesar do revés, há oportunidades para que a agenda da governança corporativa avance, tais como:

Maior ativismo institucional – Fundos de investimento e gestoras nacionais podem exercer sua voz com mais firmeza, exigindo práticas mais efetivas. Como afirmou, anos atrás, um profissional de relações com investidores à autora deste breve artigo: boas empresas costumam responder ao que o mercado demanda, quando se demanda com propriedade e assertividade.

Maior protagonismo da mídia especializada e das entidades do mercado – O debate público respeitoso, mas persistente e orientado pelo propósito, pode impulsionar o processo de estímulo a mudanças necessárias, evitando a estagnação do tema. Uma realmente boa luta não deve parar, mesmo que a jornada seja difícil.

Criação de um selo adicional mais elevado – A B3 pode avaliar a criação de um segmento voluntário mais exigente que o Novo Mercado. Ainda que leve tempo – ou mesmo bom tempo – até atrair adesão, a existência desse padrão mais alto serviria como convite à excelência corporativa. Aliás, por que não desenvolver, com o passar do tempo, o Novo Mercado 2, Novo Mercado 3 e la nave va, até que isso não seja mais necessário, porque a evolução corporativa não mais necessita? Vale a reflexão?

A B3 já demonstrou capacidade para criar instrumentos sofisticados e respeitados internacionalmente. Contudo, é preciso avançar. Regras mais efetivas são necessárias para que o nível mais alto de governança corporativa no Brasil não se torne um símbolo esvaziado, mas um convite genuíno à busca de excelência.

Por fim, o fortalecimento da governança corporativa é imprescindível para um mercado de capitais mais confiável, eficiente e funcional, servindo como efetivo instrumento de desenvolvimento do Brasil.

Mônica Mansur Brandão


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