terça-feira, 25 de agosto de 2020

As regras do jogo e sua importância para a economia


Uma tentativa de síntese do pensamento do professor Douglas North

O professor e pesquisador Douglass C. North (1990), agraciado com o Prêmio Nobel de Economia em 1993, propôs, no livro Institutions, institutional change and economic performance – political economy of institutions and decisions (1990), uma estrutura para analisar a influência do que ele denomina instituições ou regras do jogo sobre o desempenho econômico de economias capitalistas. Lembrando que a palavra instituição pode ter vários significados, conforme o autor ou a disciplina considerada.

O professor estabelece a distinção entre organizações – os jogadores – e as instituições – as regras do jogo –, fazendo uma analogia com os times de esportes. Organizações podem ser diferentes entidades, como partidos políticos, o senado, o conselho de uma cidade, uma agência reguladora, empresas, sindicatos, fazendas, cooperativas, igrejas, clubes, associações atléticas, escolas, universidades e centros de treinamento vocacional. São grupos de indivíduos unidos por uma finalidade comum para alcançar objetivos específicos. 

Quanto às instituições, estas correspondem às regras do jogo em uma sociedade, isto é, aos restritores humanamente estabelecidos para modelar as interações entre os seres humanos. As regras do jogo podem ser formais e informais e compreendem aquilo que os indivíduos são proibidos de fazer e aquilo que eles podem fazer, sob determinadas circunstâncias. De acordo com o pesquisador, as regras do jogo informais (não escritas) são mais importantes do que as regras formais e constituem a cultura do contexto considerado.

Para Douglass North, tanto a finalidade das organizações quanto a forma como elas evoluem são, fundamentalmente, influenciadas pelas instituições ou regras do jogo. Ao mesmo tempo, as organizações ou jogadores influenciam a forma como as regras são criadas e evoluem ao longo do tempo. Refletir sobre as regras do jogo ajuda a entender porque algumas nações ou regiões se tornam mais desenvolvidas do que outras com o passar do tempo, de acordo com o ilustre pensador.

A visão das regras do jogo é erigida sobre dois pilares: uma teoria sobre os custos de transação, conceito desenvolvido pelo professor Ronald Coase, vencedor do Prêmio Nobel de Economia em 1991, no artigo The nature of the firm (1937), e uma teoria sobre o comportamento humano. No que tange aos custos de transação, estes correspondem aos gastos criados por contratos, incluindo aqueles necessários para a sua elaboração e aqueles associados ao seu descumprimento, muito superiores aos primeiros. 

A teoria dos custos de transação, diga-se, influenciou o pensamento de muitos estudiosos, não apenas do professor North.  Custos de transação são de grande monta no âmbito de uma economia capitalista: ao medirem a magnitude dos custos de transação na economia norte-americana, John Jay Wallis e Douglas North, no artigo Measuring the transacion sector in the american economy, 1870-1970 (1986), constataram que mais de 45% da renda dos EUA são custos de transação.

E quanto ao comportamento humano? Douglass North apresenta uma forte crítica à teoria das expectativas racionais, da Ciência Econômica, que pressupõe a existência de sistemas cognitivos perfeitos, que originam modelos de previsão de comportamento dos seres humanos. Para o professor, os inúmeros estudos sobre o comportamento das pessoas mostram – ao contrário! – que decisões humanas são tomadas a partir de motivações complexas e, frequentemente, não racionais. 

Nessa perspectiva, os indivíduos fazem escolhas baseadas em modelos subjetivos, que variam de pessoa para pessoa e que, em função de informações incompletas, na maioria dos casos, não convergem. Há que considerar ainda, segundo o pesquisador, que a habilidade humana de processar informações mentalmente é limitada e que, ademais, existem as motivações dos indivíduos.

Assim sendo, a assimetria de informações entre os agentes econômicos na criação de contratos, combinadas com o comportamento dos indivíduos, delineados por seus modelos pessoais de decisão, seu processamento mental de informações e suas motivações, produzem implicações radicais para a teoria econômica. Desses elementos, emerge a necessidade das instituições ou regras do jogo. 

Por fim, o arcabouço institucional – o conjunto das regras do jogo e o seu cumprimento (enforcement) – tem um papel crucial no desenvolvimento da economia, segundo Douglass North. A comparação entre as regras de países como os EUA, a Inglaterra, a França, a Alemanha e o Japão, e outros menos desenvolvidos é crítica para a compreensão do descompasso entre os dois grupos. 

Após esta tentativa de síntese do pensamento de Douglas North, especialmente no que tange às regras do jogo, observa-se que estas são fundamentais para as economias, mas, além disso, são também cruciais para evitar a anomia, isto é, a desorganização social.  As regras do jogo, indo além de seus fundamentos econômicos e baseados na forma como os seres humanos raciocinam, também precisam ser consideradas sob uma perspectiva sociológica. 

Por fim, a brilhante teoria institucional do professor e pesquisador Douglass North deve ser analisada ao lado de outras teorias que também buscam explicar as diferenças entre as condições socioeconômicas de diferentes países e regiões. Isto porque, frequentemente, realidades são multifacetadas e torna-se necessário conhecer variadas teorias sobre um tema que se considera, a fim de que se possa construir uma visão do todo.

Nesse sentido, menciona-se, a título de exemplo, a visão descrita no livro Guns, germs, and steel: The fates of human societiesescrito por Jared Diamond, geógrafo, historiador, ornitólogo e autor norte-americano. Tal livro busca demonstrar como fatores ambientais, geográficos e biológicos influenciaram a formação de sociedades humanas e suas desigualdades, ao longo da história da humanidade.

Mônica Mansur Brandão     (atualizado em 6/9/2021)